(caio silveira
ramos)
Abriram
perto de casa um parque coberto, que tem como atrações trampolins, redes
elásticas, paredes acolchoadas, piscinas de espumas sintéticas, tabelas de
basquete para “enterradas” depois de saltos fantásticos e até muros escaláveis. Embora haja um setor exclusivo para adultos,
é a parte infantil que mais atrai o público: mães e pais ficam esperando
tranquilos (ou fotografando alucinadamente) enquanto suas crianças pulam
felizes, parecendo voar como passarinhos.
Pois
Joãozinho também foi voar com os amigos. E tudo ia às mil maravilhas quando o
Lolô chegou esbaforido dizendo que o João tinha se machucado. Assustada, a mãe
do acidentado saiu correndo e o encontrou num canto, com os olhos assustados e
as mãozinhas entre as pernas, tossindo, quase sem fôlego, mas sem chorar. Ao
seu lado, alguns monitores tentavam lhe dar um copo d’água, enquanto outros
explicavam à mãe do pequeno que ele tinha caído, com as pernas abertas, na
borda de uma piscina cheias de cubos de espuma. E que, mesmo acolchoada, a tal
borda acabara ferindo o Joãozinho em uma região muito sensível.
A mãe
levou o menino ao banheiro, examinou-o rapidamente e quando percebeu que ele
tinha ficado mais calmo, perguntou se estava tudo bem. E o Joãozinho, com os olhos molhados e
profundamente tristes, encarou a mãe, segurou o choro e disse grave:
“Mamãe...
eu... não vou poder mais ter filhos!”
A mãe do
Joãozinho já esboçava um riso quando percebeu que o pequeno falava sério e
sentido. Então o tranquilizou dizendo
que ele estava só assustado e dolorido, mas tudo ficaria bem. E um dia poderia
ter quantos filhos sonhasse.
“E a
dor, passou?”
“Tá
passando. Só está um tiquinho.”
“Quer
voltar a brincar?”
“Não
quero, não.”
“Então
tá bem.”
Mas
faltando uns dez minutos para acabar o tempo de acesso aos brinquedos, ele
esqueceu a dor e os temores, e aceitou o chamado dos amigos para voltar a voar.
Quando
cheguei do trabalho, já sabendo da aventura, perguntei para ele se tudo estava
bem. E se ele ainda estava com dor.
“Na hora
doeu muito, mas agora já passou tudo. Papai, você viu o gol do Messi no jogo de
hoje à tarde?”
Eu disse
que não tinha visto, mas que tentaria ver.
Só que mais do que o belo gol do Messi, ficou passeando na minha cabeça
a preocupação embutida na frase que o pequeno tinha dito a sua mãe naquela
tarde.
No
serviço, contei aos colegas. Todos
acharam muita graça e se espantaram com uma suposta precocidade do
Joãozinho. Perguntaram de onde viria
aquela ideia dele sobre a paternidade e suas origens. Respondi que talvez viesse
de uma conversa qualquer comigo ou com sua mãe. Ou talvez, da advertência cuidadosa
do professor ao orientar os meninos para se protegerem da bola na formação de
uma barreira no futebol. Uma amiga,
rindo também, observou:
“Ele é
canceriano mesmo: tem pendores dramáticos e é profundamente ligado à família!”
Eu que
desconheço o caminho dos signos, mas me perco perseguindo a poesia,
sorri-devaneando com os sonhos do filho.
Não, não
me empavonei por imaginar orgulhosas e numerosas descendências. Mas sorri por João perceber, na sua ainda
curta existência, que a paternidade pode ser uma experiência prazerosa. E, ao
que parece pelo tamanho do seu temor de não conseguir conhecê-la um dia,
entender que é algo que comporta mais do que a simples capacidade de ajudar a
criar outro ser.
É algo
que tem a real e bem-aventurada possibilidade de tentar fazer esse outro ser
mais feliz.
Ilustração de Erasmo Spadotto - cedida pelo Jornal de Piracicaba
Publicado no Jornal de Piracicaba em 11/2/2018
Publicado no Jornal de Piracicaba em 11/2/2018
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